Marília Mendonça mostrou que sofrer é preciso

A morte precoce da cantora Marília Mendonça, aos 26 anos, fez e continuará a fazer o Brasil sofrer por muito tempo ainda.
Nossa reação natural diante de uma notícia tão brutal como essa é a de tentar entender e dar dimensão à tragédia. Por que isso foi acontecer com uma pessoa tão jovem, tão talentosa? Falha mecânica? Falha humana? O que teria levado aquele avião bimotor a cair e tirar a vida de Marília e de outras quatro pessoas que também deixam familiares e amigos tão cedo?
Por mais que a gente tente encontrar explicações racionais para confortar o coração e a alma nessas horas, a verdade é que a morte é uma fatalidade. Infelizmente inevitável e, muitas vezes, imprevisível.
Qualquer pessoa que já perdeu um ídolo, um amigo ou um parente sabe que a única certeza diante da morte é que temos de aceitá-la e seguir tocando a vida. E valorizando cada passo e cada dia nessa jornada de altos e baixos que ela é.
Como a milhões de brasileiros, a morte de Marília Mendonça também bateu forte aqui entre nós na Rock Ensina.
Para uma escola que trabalha diariamente conceitos como autoconhecimento, autoestima e resiliência, não há como não tirar o chapéu para uma artista como Marília Mendonça, que fez do sofrimento não só combustível para suas canções mas um gênero em si.
Marília pode não ter inventado o estilo, mas tão logo surgiu no cenário musical, por volta de 2016, foi logo coroada como a Rainha da Sofrência.
E não se trata de exagero ou golpe de marketing. Marília mereceu em vida e seguirá merecendo esse reconhecimento por ter eternizado em canções sentimentos que dialogam com praticamente todo mundo que já amou, traiu, perdoou ou deu a volta por cima.
Especialmente as mulheres, que até a chegada da cantora, tinham ainda pouco espaço na música sertaneja. Junto com Maiara e Maraísa, Simone e Simaria e outras, Marília Mendonça deu origem ao “feminejo”, uma música sertaneja que não é feminista no sentido acadêmico do termo, mas que empoderou e deu voz a uma geração de mulheres que não aceita mais o papel de coadjuvantes ou de submissas.
Ou melhor, que até aceita o papel de submissa ou de amante de vez em quando, mas só se ela quiser. Se isso lhe der prazer, se desse sofrimento, de alguma forma, ela souber a tirar algo de bom.
Marília fez do sofrimento a sofrência, transformou a perda em uma força e a mulher traída — e que trai — em uma espécie de heroína do Brasil real.
Mais que isso: a música e os sentimentos que Marília Mendonça colocavam em suas e letras eram por vezes tão universais e atuais que, em muitas delas, você pode trocar a mulher pelo homem que tanto faz. No jogo do amor e da sedução, todos ganham um dia e perdem no outro. Todos caem, se machucam, se levantam, aprendem com isso ou voltam a cair no dia seguinte. E tudo bem.
Com sua música, que não saiu das paradas desde que estreou e durante esses tempos difíceis de pandemia, Marília Mendonça mostrou ao Brasil que sofrer é preciso. Que os tombos fazem parte da vida e que só a partir deles é que podemos tirar ensinamentos e energia para seguir vivendo e melhorando a cada dia.
Em sua autenticidade de menina do interior, criada à moda de viola raiz e internet, Marília Mendonça dizia com suas composições simples e assertivas a mesmíssima coisa que um intelectual respeitado como Nassim Nicholas Taleb diz em seu clássico sobre a antifragilidade.
Seja na vida, no trabalho, na família ou nas relações amorosas, é inútil buscar a perfeição e a previsibilidade. Queira você ou não, o mundo em torno da gente é feito de caos e perdas diárias. Resta a nós transformar a dor e o sofrimento em combustível para seguir de pé e, assim que possível, superar.
Acho que é isso que Marília diria.
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